Desde os primórdios da Internet, quando a própria ainda nem era denominada assim, os usuários já encontravam naquilo que acabavam de descobrir uma grande fonte de informação, e desde lá a música já se encaixava no quadro. O primeiro BBS, acrônimo inglês de bulletin board system, apareceu em 78, em Chicago. Além de proporcionar a distribuição de softwares, informações e lazer, os BBSs eram usados por empresas que precisavam integrar seus funcionários externos. Algum tempo depois pequenos grupos de aficionados por música se conectavam ponto-a-ponto (como no Napster muitos anos depois) via linha telefônica para trocar versões inéditas de seus artistas preferidos e bootlegs, gravações não autorizadas que na maior parte das vezes era inadequada para qualquer tipo de conteúdo comercial. A troca de informações gerava um contato comum e afetivos entre os usuários.
Na década de 90 a internet se democratizou e o mesmo aconteceu com a música digital. O conglomerado de redes em escala mundial de milhões de computadores interligados permitiu o acesso a informações e todo tipo de transferência de dados. A novidade gerou uma oportunidade para aqueles que gastavam muito tempo e dinheiro por informações que agora podiam ser acessadas instantaneamente. O Napster foi o primeiro programa de compartilhamento massivo de arquivos através de tecnologia ponto-à-ponto (peer-to-peer). O problema de compartilhar arquivos em massa é que diferentemente dos BBSs, a música como informação preciosa perdeu o valor em meio ao mar de gravações comerciais que ao mesmo tempo em que faziam as pessoas economizarem dinheiro e tempo, fez com que as gravações mais raras e os grupos mais restritos de geeks perdesse a força. Hoje é difícil encontrar um sistema de compartilhamento que não esteja encharcado de vírus camuflados e musicas falsas. O contato com outros usuários não existe mais e o que antes eram trinta minutos de ligação telefônica – isso se não caísse a conexão - e alguns caracteres sobre bom gosto musical, hoje se trata em compartilhar apenas alguns entre tantos megabytes de banda-larga.
Enquanto isso entusiastas defendem a superioridade do vinil em relação às mídias digitais como algo religioso. O principal argumento é o de que as gravações em meio digital cortam as freqüências sonoras mais altas e baixas, eliminando harmonicos, ecos e batidas graves e "naturalidade" e espacialidade do som. No entanto, naturalmente, estas justificativas são tecnicamente infundadas e essas pessoas são denominadas audiofilos. Existem ainda os DJs, que ainda utilizam os longplays para manter o charme, é claro. Os CDs, DVD-Audio, HD-CD e etc. nem precisariam ser mencionados, já que os grandes circulos com furos no meio, ou ainda os pequenos como o falecido Mini-Disc da Sony, estão fadados a morte como seu irmão menor. Os micro componentes e as memórias flash são infinitamente superiores e substituirão todas as outras mídias em questão de tempo e economia de escala.
Para encontrar oportunidades sub-aproveitadas no universo musical digital basta olhar para trás. Hoje, por trás dessa cegueira branca que ofusca as informações - não por falta delas mas pelo excesso - ainda estão os mesmos consumidores que buscam por conteúdos cada vez mais específicos e necessidades cada vez mais infundadas. Seja um adolescente atrás de uma rara gravação de uma banda emocore da África ou um professor de música que busca a coleção completa do seu artista predileto em valiosa precisão sonora. Apostar na Cauda Longa quando se trata de música, é algo economicamente interessante, ao contrário do que acontecia antigamente quando a música era um tanto quanto tangível, já que o disco de vinil mede 31 centímetros de diâmetro. Um exemplo a ser citado é o da Amazon: lá é possível encontrar livros que são procurados por milhares de consumidores mas também livros que são procurados apenas pontualmente por nichos pequenos de consumidores. Ao contrário do que acontece numa livraria real, os custos associados à manutenção em exposição de produtos muito pouco procurados são iguais, da mesma forma ocorre com o iTunes em relação as lojas físicas de música.
O Brasil por enquanto assiste a carnificina da RIAA e da IFPI da sala VIP, mas ao contrario do que muitos pensam isso pode acabar tão rápido quanto o HD-DVD. Um dos motivos é o aquecimento do mercado de música digital no país. Foi só a iMusica e a UOL MegaStore começarem a travar as primeiras batalhas do setor que pistas sobre serviços concorrentes começaram a aparecer. O Terra oficializou a sua, e mesmo sem anúncio oficial, é improvável que a Globo.com, um portal formatado para conteúdo multimídia e com toda a biblioteca da Som Livre por trás, vá ficar de fora desta.
Pela primeira vez a ABPD divulgou estatísticas oficiais sobre o mercado de música digital no País, juntamente com as estatísticas de 2007, de vendas de CDs e DVDs. As receitas com música digital no Brasil, apresentaram no ano passado, aumento de 185% em relação a 2006. As vendas através de telefonia celular cresceram 157% em 2007 e suas receitas representaram 76% do total do mercado digital.
O segundo motivo é que por aqui ninguém quer pagar por algo que está disponível de graça. Após a primeira condenação por pirataria de filmes, promovida pela MPA em parceira com a ADEPI, é questão de tempo até que o primeiro “pirata” brasileiro de música seja considerado culpado. Não é surpresa que a venda de música digital no país tenha uma enorme parte de sua renda graças a telefonia móvel. A Internet é democrática, mas a telefonia não. As empresas de telecom cuidam muito bem do que é do seu próprio interesse, mas quem cuida da internet? A Oi que não é. Essa é uma resposta que encontraremos nos próximos anos, ou quem sabe meses, enquanto isso o Brasil todo aproveita, e quem quer comodidade e gravações especificas paga por isso, e nessa parte, como consumidor, posso dizer com certeza: vale a pena.
Um comentário:
Parabens pelo texto, há tempos não via uma resenha tão completa e aprofundada sobre o assunto, que apesar de estar na agenda setting das pessoas, é tratado com superficialidade.
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